Quem quer a reconciliação só fala mal do ex. Quem não deseja o retorno só fala bem do ex. Eis a principal incoerência do amor.

Aquele que busca a volta faz o caminho exatamente oposto à uma reaproximação: cava suspeitas e desconfianças, desata demônios, desfia rosário de insultos e exorciza todos os defeitos da vida a dois. Está impregnado de ódio, e o ódio ainda é atração. A raiva indica que não resolveu a situação, não aceitou a despedida, que prossegue discutindo a relação sozinho. Vai dizer que o ex não presta, não vale coisa alguma, é um estropício. Espalha a bílis entre os mais próximos. Engana os amigos e familiares, que juram que ele não tem vontade de ver a antiga companhia nem morta na frente, que deu um basta para a esperança. Mas é uma camuflagem emocional, o que mais anseia na vida é o reato, apenas não sabe como e disfarça sua urgência com a maquiagem da racionalidade.

Já aquele que terminou de vez o relacionamento e não se interessa por recaídas usará seu tempo para reconhecer a recente parceria. É capaz de escrever uma carta de recomendação. Dirá que o ex foi ótimo, que leva boas lembranças e que amadureceu no namoro ou casamento. Sairá agradecido, pois não guarda nada, inclusive o rancor. Está com a emoção quitada, a ponto de não espernear e muito menos se rebelar contra o destino. Fará votos de que o outro seja feliz e que encontre alguém que lhe mereça. Os que observam a reação de fora pensam que a pessoa mantém o forte apelo de retornar, pois se derrete em homenagens, mas é uma armadilha: o elogio vem do desapego e da indiferença.

Durante a separação, a vaia é de quem ama, o aplauso é de quem desamou. O grito é de quem ama, a fala civilizada é de quem desamou. O protesto e a fofoca são de quem ama, o reconhecimento e a justiça são de quem desamou. O barraco é de quem ama, a casa com piscina é de quem desamou.

No tribunal cardíaco, tudo é o inverso do discurso. O que recusa a retomada da relação é o advogado de defesa. E o promotor, o que acusa, é o que estranhamente pretende inocentar a paixão.

(Autor: Fabrício Carpinejar é poeta, cronista, jornalista e professor,  é autor de 26 livros)




A busca da homeostase através da psicanálise e suas respostas através do amor ao próximo.

12 COMENTÁRIOS

  1. não acredito nisso! relacionamento que acabam de forma cheia de magoa e o parceiro aprontou gera no outro raiva e sede de justiça e isso ñ é vontade de se reconciliar.

    • Vc se engana ao pensar isso. O que vc pode sentir é a raiva do fato de que destruiu tudo aquilo que você gostaria que ainda se mantivesse. Você ama a pessoa, mas odeia o que ela fez. Se realmente não quisesse nada com ela, você simplesmente esqueceria, partiria pra outra. Sentir raiva de alguém que um dia lhe foi tão querido é a mais pura prova de que essa pessoa ainda predomina em seus sentimentos com muita intensidade. Ainda é puro amor!

  2. Tem um fundo de verdade… Quando a relação acaba, acaba! O sentimento vai embora e fica uma profunda simpatia e até nostalgia das boas horas, só isso! Mas, quando acaba mal, não acaba… fica a mágoa, o despeito e a vontade de voltar às vezes confundida com amor, mas, é apenas, para passar a limpo, tentar rever situações… Ou simplesmente se enganar… E ai vale chamar a atenção de quaisquer modos…

  3. Nem raiva pra sair dizendo mal dele a 4 cantos do mundo
    Nem carta de recomendação dizendo que agradeço mas aceito o término.
    Em meio a esse 8 ou 80 do texto tem eu, sem me encaixar em nenhum deles, que nesses 2 anos em que nos separamos, eu engoli e guardei pra mim todo e qualquer sentimento sobre nosso rompimento e agora, 2 anos depois o término, eu já estou tão transbordada de acúmulos que quando vou falar com alguém sobre ele, acabo transbordando e narrando sobre a maravilha que foi nossa relação e como ainda não caiu a ficha de como um amor tão docinho, tão puro e até mesmo fraternal pode ter se deixado levar pela distância e uma promessa de ”festas e curtição de solteirice”.

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