O filme atual sobre o homem de aço e seu então rival Batman, suscita muitas indagações e questionamentos; o quanto não aceitamos o que é diferente de nós, o quanto nos amedrontamos diante de uma força maior que nós.

Para iniciar, a questão que quero levantar (e que nem de longe pretendo esgotar essa questão) é a de que ainda esperamos por heróis externos, por isso essa comoção e necessidade de adaptações de super heróis nos cinemas. Trata-se de uma necessidade de forte conotação emocional inconsciente. E o que precisamos olhar nesses heróis que ainda não vimos em nós?

Superman é o típico herói solar (tanto que sua força vem do Sol), um messias, o filho de um Deus que desceu a Terra. Ele é o herói que ansiamos e tememos ao mesmo tempo.

Com ele levantamos alguns questionamentos. Entre eles é de que no mundo humano ninguém pode se arrogar ser um Deus. A divindade não está no plano humano e não deve permanecer.

No filme anterior Superman mata seu inimigo e isso abre um questionamento que é levado para o filme atual.

Conforme Von Franz (2002):

“O fato de que alguém possa se imaginar matando um semelhante, alguém da mesma substância, o que não é normal em animais de sangue quente, transcende a natureza humana e nesse sentido adquire essa qualidade divina ou demoníaca.”

Essa era a essência dos povos primitivos ao sacrificarem aos deuses. Eles sacrificavam, sem julgamento prévio, assassinos, pois se um ser humano age como se fosse divino, então deve sofrer o destino de um deus e da mesma forma que um deus, deve ser enforcado, morto, esquartejado, e assim por diante. Não se pode viver numa sociedade humana e se comportar como um ser divino que pode matar à vontade.

Essa é então a estranheza que Superman causa na humanidade. É um novo paradigma causado pelo herói solar, que há algum tempo já tema imagem sendo gasta devido a unilateralidade a consciência ocidental.

Superman é em alguns momentos retratado como Messias e salvador. No entanto, essa imagem é manipulada pelos meios de comunicação. O Homem de Aço é um alienígena, não pertence ao plano humano e mesmo assim, possui emoções humanas bem violentas; ele é a representação de um Deus que desceu a Terra.

Contudo nas Mitologias, todo aquele que representa a encarnação de um Deus na Terra, como os heróis Mitológicos que possuíam filiação divina, precisam aprender por meio de sua jornada, a controlar esses impulsos desgovernados que só as divindades possuem.

É nesse ínterim que surge outro herói: Batman, que se opõe a essa divindade.

Ele surge de sua caverna, envelhecido, solitário e sem nada mais a perder.

Batman é humano e possível, não é um Deus, um alien, nem mutante. Ele usa o suor de seu rosto para lutar com o mal. Ele tem inteligência e sofrimento na alma suficientes para lhe transformar em herói. Ele é noturno, lunar, ctônico.

Ele se assemelha ao Hades grego, senhor do submundo, da morte. Mas agora envelhecido se aproxima da consciência Senex, e por isso não teme a morte.

Batman se volta contra Superman. Algo adormecido no fundo da terra, uma força a ser reconsiderada

Como herói lunar, ele possui uma forma de consciência bem diferente de Superman. Ele é seu oposto e simboliza um aspecto rejeitado pela consciência coletiva.

O morcego está associado ao sombrio, à morte e à noite. A imagem do morcego está relacionada ao vampiro, por ser um animal que suga o sangue de outros. O morcego também simboliza o mal, e está relacionado à imagem do Diabo quando este é representado com asas, à bruxaria e a magia negra.

O morcego, em seu lado positivo, também representa o renascimento. Para os chineses, o morcego simboliza felicidade, sorte e vida longa. Eles o consideram um animal inteligente e sábio: ele voa de cabeça para baixo por causa de seu avantajado cérebro. O morcego simboliza, por ser um animal noturno, o desafio de atravessar a escuridão, enfrentando as dificuldades, para encontrar o caminho da luz e do bem.

Portanto, Batman representa uma sabedoria perdida, que foi projetada nas bruxas durante a inquisição. Uma sabedoria da Terra, dos ciclos da Lua, da magia, da sedução, do mistério, dos instintos, da intuição, o conhecimento medicinal das plantas e a harmonia com a natureza. O contato com o irracional, inconsciente e com o destino.

Superman, como herói solar, representa a perfeição, a luz e o distanciamento do que é irracional, o corte com o mal, com a dor, com a escuridão. Ele é o símbolo da sociedade ocidental que visa a eficiência, a exploração dos recursos naturais e a obtenção de capital e bens a qualquer preço. O patriarcado (nos filmes ele está sempre em busca do Pai), a lei e a ordem.

Mas ver o Superman apolíneo ser tomado por emoções e quase sucumbindo a Batman, pode simbolizar que esse símbolo precisa ser revisto, renovado. Nossa atitude precisa mudar, pois estamos a beira de um colapso da natureza, com uma superpopulação e o desgaste dos recursos naturais. Ou seja, um símbolo que já está bem desgastado.

Batman então se ergue contra esse símbolo, mas após o embate se junta a ele em uma nova dinâmica que une ambas as formas de consciência.

O Batman ctônico, pode simbolizar o inconsciente, local onde estão os tesouros de nossa alma, nossas potencialidades, ou seja, os elementos que ainda não vieram à luz e que continuam nas sombras. Bem como nossos demônios interiores, nossos terrores, nosso inferno pessoal, as coisas mortas e reprimidas.

Basta que olhemos para isso!

Para finalizar, coloco algumas observações, sobre o aparecimento da Mulher Maravilha. Minhas considerações e que devem ser exploradas um pouco melhor nos próximos filmes, é a de que talvez ela apareça como uma função transcendente; ou seja, aquela que une os opostos. Mas isso fica para o próximo filme.

Referências bibliográficas:

VON FRANZ, M. L. A sombra e o mal nos contos de fada. 3 ed. Paulus. São Paulo: 2002.




Hellen Reis Mourão é analista Junguiana e especialista em Mitologia e Contos de Fadas. Atua como psicoterapeuta, professora e palestrante de Psicologia Analítica em SP e RJ. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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