A existência de cada um de nós sempre nos convoca a responder por diversas situações. Nascemos e crescemos, normalmente, em um núcleo familiar e o bom funcionamento deste depende sempre de todos os membros. Conhecemos pessoas ao longo da vida, e nossas atitudes sempre gerarão reações nos outros e as atitudes dos outros gerarão reações em nós, que por sua vez gera um movimento no outro, e assim por diante. Ou seja, nossos atos e a existência pedem resposta, responsabilização.

Na teoria isso é simples, e acredito que o (a) leitor (a) concorde. Entretanto, a cada momento, na vida prática, responder por tudo o que nos cabe, nem sempre é o que ocorre (ressalto nesse momento que responder pelo que nos cabe é diferente de responder pelo que nos pedem. Em um há um conjunto de fatores que mostram ao que devemos responder, e no outro, existe apenas uma exigência ou pedido de alguém, o que não necessariamente nos cabe cumprir).

O que me cabe? Eis uma pergunta difícil de responder de forma objetiva. Depende de alguns fatores. Um deles é o sentido íntimo que diz “parece que isso é responsabilidade minha”. Esse sentido pode vir, por exemplo, quando uma mãe percebe o choro de seu filho. Ela geralmente sente que isso é sua responsabilidade. Ou quando eu não estudo para uma prova cujo conteúdo sei que não domino. Sinto que não estou fazendo o meu melhor. Outro fator é uma observação mais objetiva.

Voltando a um exemplo anterior, se eu, que sou mãe e tenho leite materno a oferecer e vejo que meu filho está há horas sem comer e está chorando, posso deduzir objetivamente que cabe a mim oferecer esse alimento a ele. Da mesma forma, ao perceber que me sinto perdido em uma prova quando não conheço o conteúdo da mesma, quando tiro uma nota baixa por conta disso, percebo, objetivamente, que ter domínio sobre este conteúdo me possibilitaria responder melhor às questões, ou seja, cabe a mim estudar para fazer bem uma prova. Basicamente, esses seriam elementos satisfatórios para se compreender qual a intenção desse texto ao se referir ao que cabe a cada um de nós.

Diante disso, existem as mil possíveis fugas. Muitas vezes preferimos algo que nos agrade do que responder por algo que nos cabe. É muito comum, por exemplo, diante de dilemas ou momentos de angústia, pessoas procurarem “esquecer um pouco os problemas” bebendo com amigos, jogando vídeo-game, praticando esportes, indo a festas, etc, etc. Absolutamente não há um problema com estas atividades citadas. A única pergunta é: o que nos move a buscá-las?

Por exemplo, diante de uma situação em que me sinto culpado por ter feito mal a alguém, ao invés de ir diretamente a este alguém e me desculpar ou me retratar, prefiro curtir a noite em uma balada, me distrair com a família passando um fim de semana fora de casa, ou até mesmo buscar a paz de uma prática de meditação. Troco uma situação angustiante por uma prazerosa.

O único problema, muitas vezes negligenciado no momento dessa escolha, é que a situação prazerosa sempre acaba e a angústia não vai deixar de existir (mesmo que se ache o contrário) enquanto não for encarada e respondida de frente. Parece que às vezes a vida é muito pesada para que possamos responder suas questões, mas são justamente elas que fortalecem nossa capacidade de escolher e sentir melhor a existência.

A cada momento estamos escolhendo, e fazê-lo de forma consciente é a grande riqueza da existência. E ao mesmo tempo, esta sempre nos chama a responder. Ou seja, a grande beleza da escolha está quando percebemos a vida e sabemos interpretar quais as questões pelas quais precisamos nos responsabilizar.

Assim a vida prossegue, num suceder de novos anseios e desafios, nos quais somos autores e cocriadores de nós mesmos e dos outros.




Psicólogo, reside no Rio de Janeiro e é colunista do site Fãs da Psicanálise.

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