Imagine um copo tão cheio de água, mas tão cheio que ao segurar-lhe a água transborda e escorre por suas mãos, molhando-as e fazendo sua pele sentir o frescor do líquido. Assim é o coração dos que atrevem-se a exceder os sentimentos, preferindo além do todo, ser muito.

Se você é um potencial amante excessivo, com certeza já escreveu cartas, digitou textos, cantou músicas, enviou corações, disse bom dia sorrindo, afirmou ter sonhado com o outro, falou dos sentimentos da maneira mais aberta que pôde, entregou-se a carícias como se não houvesse amanhã, e… E infelizmente algum tempo depois se viu só, sentado num canto, ouvindo música e pensando “onde foi que eu errei?”, na esperança de encontrar um ponto, um momento, um encontro, uma palavra, uma coisa qualquer que justifique o abandono causado. E não é a primeira vez, não é mesmo? Isso sempre acontece com você.

Essa coisa de em meio ao mar de amor aparecer uma ilha deserta de terra seca. Essa dificuldade em fazer alguém permanecer ao seu lado. Afinal, qual sue problema? O que há de errado com você? Será sua aparência? Mau hálito? Talvez você beije mal, ou falte-lhe a bendita ‘pegada’… Talvez não tenha descrito as estrelas da maneira correta, ou até mesmo seja desafinado demais na hora de cantar… Vai que o problema são suas roupas? Sei lá, religião, talvez?

É, eu sei que todas essas coisas já lhe passaram pela cabeça, e fizeram seu coração sangrar até não ter mais o que escorrer. Eu sei que as noites foram longas enquanto você pensava sobre qual é o seu problema, e que quando olha para trás infelizmente restam-lhe apenas marcas do que podia ter sido, mas que por incrível que pareça nunca é, e é exatamente por isso que hoje estou aqui.

Você precisa urgentemente saber que o problema não é a camisa cor-de-rosa que estava mal passada, nem a saia de flores que não combinou com seu corpo. O problema não está em sua maneira de falar, nem em seu jeito dócil de ser. Também não é sua graduação, nem nenhum problema de saúde, e muito menos a cor dos seus olhos. O problema não é nada disso, porque na verdade o problema não está em você.

Quando à nossa frente há um enorme e transbordante copo com água temos duas opções: toma-lo e saciar a sede, ou derrubar metade da água na pia e depois dizer “estava cheio demais”. E aqui está o problema; a maioria das pessoas – na verdade grande parte delas – vai jogar a água fora com medo de se molhar. O problema não é o excesso de água do copo; o problema é a ideia de que, caso se molhe, não haverá como secar. A história não acontece com você sempre da mesma forma porque você é ‘ruim de amor’; a história repete-se porque nem todos estão prontos para encarar frente a frente um amor puro, verdadeiro e transbordante.

Veja bem, estamos vivendo uma época onde tudo é descartável, rápido e superficial. Nossas felicitações por aniversário são um ótimo exemplo disso. Antes, íamos até a casa do outro a fim de lhe abraçar e juntos comemorar o novo ciclo. Hoje, limitamo-nos a enviar emojis de bolo e coração que serão vistos através de uma tela. Percebe a frieza?

É por isso que os que amam de maneira intensa e optam por lançar-se ao sentimento, sempre trazem à vida do outro medo do que está por vir. Os amantes excessivos são entregues à prática dos abraços, conversas longas, cafés olhando a lua, ‘eu te amo’, olho no olho, mão na mão, pele na pele. E não sentem medo na entrega, muito menos receio de haver arrependimentos, pois, a seu ver, arrependimento mesmo deve ser perder a oportunidade de dar amor. E isso, apesar de lindo, para muitos é assustador.

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Essa coisa de dar a mão sem pedir o braço em troca traz ao amado à ideia de que talvez, infelizmente, não se dará conta de ser essa Coca-Cola toda, e então, é hora de partir, antes que essa pessoa tão apaixonada perceba onde está se metendo e frustre-se ao cair na real de que suas expectativas não serão supridas. Pena que ao saltar do barco o amado não se dá a oportunidade de saber que o amante excessivo não tem um ideal de pessoa, mas apenas amor.

Querido amante excessivo, você não está só; somos muitos. Somos uma multidão de corações transbordantes, que de tanto amor que guardam em si, apesar das muitas dores, sempre escolhem recomeçar.

Você vai encontrar quem não lhe jogue fora a água com medo do peso do copo, e que venha com sede ao ponto de beber o suficiente para também transbordar por você. Apenas continue com sua vida, sabendo que o problema não está em seu jeito leve de sorrir, e nem em seus abraços apertados. Não é pecado algum ter tanto amor dentro de si, pelo contrário, é uma dádiva. O problema é que só compreende o valor de um copo de água quem tem sede, e não quem já está satisfeito.

Por isso, espere. Sim, eu sei que este não é o melhor conselho do mundo, mas é o único que neste caso faz sentido. Você precisa de alguém que ao perceber seus excessos não vá embora com medo de não supri-los, mas sim, esforce-se para pouco a pouco aprender com você como é bom ser abraçado com pureza. Você precisa de mãos que lhe apoiem e não que lhe segurem ao ponto de travar. Você precisa de alguém que queira ser amado proporcionalmente ao amor que você pode entregar.

Espere amigo excessivo. Espere. Quando menos imaginar alguém chegará de maneira inusitada o suficiente para um dia, enquanto sorri pensando em como é bom rir de tudo, lhe fazer compreender o motivo pelo qual mais ninguém permaneceu.




Há quem diga que os olhos são a janela da alma, então, no meu caso, eles são uma janela bem grande e aberta. Amante das artes, do universo e das palavras, necessito de música para viver, dos astros e estrelas para pulsar e dos versos para existir. A publicidade me escolheu; por isso anuncio paz, promovo sorrisos e transmito intensidade. Sou colunista do Fãs da Psicanálise.

1 COMENTÁRIO

  1. Na terceira linha eu já me transbordei em lágrimas.

    Esse texto me vestiu. Tento e tento… Quando achava que tinha dado certo, a pessoa teve medo de “transbordar”.

    Obrigado pelas palavras

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