Ia atravessando a rua com muita pressa na hora do meu almoço, tropecei no meio fio e quase caí. Comecei a me xingar em pensamentos.

Ninguém me socorreu, apenas uma senhora me perguntou se estava tudo bem.

Fui conversando em pensamentos comigo mesma pelas ruas. Falo sozinha quando não tem alguém por perto, aprecio um monólogo terapeuta, porque me acalma e eu me dou conselhos ótimos.

Eu mesmo me oriento, me pondero e me dou opinião.

Não abro mão de ligar para os meus amigos ou encontrá-los em um bar. Não dispenso um dedinho de prosa quando encontro conhecidos pelas ruas. É uma alegria conversar com os meus pais e minha irmã todos os dias, mas bater aquele papo diário comigo mesma, mesmo que em uníssono, em uma só voz, não tem coisa melhor.

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Em casa, eu converso o tempo todo comigo. Falo sobre o tempo, reclamo a falta de grana, pergunto o que preciso pagar e comprar; faço caras e bocas quando penso em algo que não deu certo ou me magoou. Falo o que queria, em pensamento, para aquela pessoa chata e sem noção, e respondo verdadeiramente todas as perguntas indiscretas. Falo o que eu não tenho coragem, imito as pessoas, xingo palavrões que ficaram na vontade devido a educação, resmungo do trabalho e falo de amor, é claro.

Eu falo, eu me escuto, logo nos entendemos e, nesse momento, percebo o quanto a minha conversa é agradável e me realiza. Sabe, às vezes, conversar sozinha é como libertar do que oprime, é ser eu mais de 1000% verdadeira, é sintonizar em mim mesma sem qualquer limite ou intervenção.

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Converso comigo mesma não por solidão, ou por falta de paciência, ou por ser louca ou por ser problemática, é que entre eu e eu, minha alma e eu, meus pensamentos e eu existem afinações perfeitas, ajustes impecáveis, afinidades invejáveis. Eu e eu, sinceramente, nos damos muito bem e somos inseparáveis.

Falar sozinha não é loucura, é ser livre para pensar e é se achar no tumulto dos pensamentos. Eu me acho a melhor companhia quando estou sozinha, quando estou em casa descansando ou cuidando dos meus afazeres. Não tem nada mais prazeroso do que estar limpando a casa e colocar a conversa em dia comigo mesma.

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Eu converso com a televisão também, aliás, eu discuto com os personagens dos filmes e séries. Dou sugestões de roupas, critico a política e economia, xingo os absurdos e choro com as barbáries. Dentro de mim existe uma alma silenciosa que precisa de atenção, um coração apaixonado por tudo e que transborda, sentimentos que precisam de afagos o tempo todo, então, converso com eles, porque eu preciso falar do que vive dentro de mim.

Falo sozinha, ando distraída e sempre que posso, eu sou pura atenção para estar comigo mesma. E, eu não suporto quando sou interrompida. De médico e louco, todos temos um pouco, e eu sou doida varrida.




Simone Guerra é mãe, escritora, professora e encantada pela vida. Brasileira morando na Holanda. Ela não é assim e nem assada, mas sim no ponto. Transforma em palavras tudo o que o coração sente e a alma vive intensamente. Apaixonada por artes, culturas, línguas e linguagem. Não dispensa bolo com café e um dedinho de prosa.

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