Minha mãe demorou pra contar, sabe? Calma mãe é só uma doença! Mas confesso que fiquei preocupado.

Eu tenho uma doença incurável e tomo muitos remédios hoje e desde o dia desse diagnóstico. Minha mãe chorava no canto, e eu ouvindo uma voz dizendo: “você é um perdedor”.

Quando no ápice da doença cheguei pra essa mesma mulher que chamo de mãe e disse “Mãe, me deixa morrer? Seu filho não aguenta mais.” Prontamente minha mãe respirou fundo e disse “Enquanto eu estiver viva, você também vai estar”.

Eu quase matei a minha mãe. Minhas crises me deixavam agressivo e com uma angústia inexplicável. Mamãe dizia que “Jesus” estava comigo. Quem esse cara? Eu sempre perguntava isso, mas não recebia resposta.

Minha irmã se formando, meus amigos namorando, meus primos jogando bola e indagava: “mãe, eu ainda vou fazer isso?” – Era uma pergunta que mamãe não sabia responder, nem médicos, acho que talvez até esse tal de Jesus nem soubesse também responder.

Mamãe fazia tudo pra mim e chegou a me dar comida na boca porque não conseguia levantar da cama. Às vezes eu não dormia e ficava olhando para o teto pensando no dia em que aquela vida ia acabar.

Acordava de madrugada e ia ao quarto dela dizendo que estava com medo. Ela me acalmava com afagos na cabeça e eu tremendo de medo do mundo sempre com a pergunta: Mãe, eu sou normal? Mamãe olhava pra mim com medo também, era frágil como eu. Talvez até mais.

Mas sabe quem me passava mais segurança? Mamãe! Mesmo insegura, pois a voz dela era necessária. Mãe, desculpa por quebrar a sua televisão da sala, desculpa por quebrar mais de dez armações de óculos em menos de um mês e fazer com que você gastasse todo o seu dinheiro. Sem televisão você ficava, mas eu não podia ficar sem enxergar. Hoje eu enxergo isso de uma forma tão ampla, sabe mãe?

“Desculpa a minha rebeldia mãe, eu queria viver!”. E quando eu consegui o ponderamento da minha doença, minha mãe me abraçou e começou a chorar junto comigo. Abraçada comigo disse: “Brilhe!”. Eu tinha todos os defeitos do mundo, mas eu era uma cara muito obediente.

Hoje eu estou brilhando, mas a culpa é sua. Aliás, não se sinta culpada por eu ser dito pela sociedade como uma pessoa doente… Ninguém tem culpa, você fez o que podia. Aliás, você fez mais, que foi a sua companhia. Mesmo quando era levado pelos bombeiros ou ia ao médico tremendo de medo.

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O mundo dá muitas voltas e quando eu vi a minha mãe precisando de mim, foi o ápice para me libertar e cuidar da pessoa mais importante da minha vida. Ainda um pouco assustado, mas o maior problema que eu enfrentei e ainda enfrento é a confiança da minha mãe. De que eu não ia ter mais crises, de que eu não ia me cortar, de que eu não ia mais quebrar coisas na casa…

Desistir? Talvez lá no começo eu tivesse desistido. Mas mamãe mesmo não sabendo o que fazer não desistiu. Talvez quando eu tiver um filho entenda isso como um pai. Minha mãe é muito forte, eu não estou curado da minha doença, mas hoje ela está mais frágil que eu. Mamãe tem depressão.

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Faço comida, faço compras, já troquei fralda da mamãe porque ela teve problemas e quando quebrou o fêmur e tive que esquecer qualquer voz diferente da “seja forte”. Minha mamãe continua sendo a minha melhor amiga e o sorriso dela o motivo pra que as forças sejam extras. Às vezes olho pra mamãe escondido e choro. Mas aconteceu e hoje eu estou mais forte e cuido dela. As coisas mudam, sabe?

Aquela voz que dizia que eu era um perdedor, hoje é tão baixinha, mas tão baixinha que dá pra ouvir claramente depois de um dia cansativo com a mamãe, ela olhando pra mim e dizendo:

– Filho, você é um vencedor!




É escritor, estudante de Psicologia e é colunista do site Fãs da Psicanálise.

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