Com 13 anos, fiquei com um menino da minha escola. Caio. Um desgraçado. Me disse que eu seria sempre o segundo lugar na vida de todas as pessoas que passassem pelo meu caminho. Não satisfeito, disse que eu mandava mal em preliminares sexuais que eu nem conhecia. Eu estudava numa escola pequena, numa cidade pequena. Não preciso falar sobre os olhares tortos na hora do intervalo, né? O que mais me machucou na vida não foram os olhares tortos, mas ser o “segundo lugar”.

Com 18, tive um relacionamento longo e sério. Amei desesperadamente, não existe palavra melhor para definir isso. Bonito, simpático, engraçado, amável. Foi com essa pessoa que tive minha primeira vez. Dolorida, como a maioria das primeiras vezes. Na minha cabeça, minha primeira vez não é uma lembrança nítida. Pode ter sido qualquer uma das primeiras 7 vezes, doloridas.

Lá pela terceira vez, fui questionada sobre minhas inseguranças na hora de transar. O “não”, pra mim, era uma palavra frequente. “Vamos fazer assim?”, não. “E de outro jeito?”, não. A dor física, um tanto causada por cicatrizes emocionais, outro tanto por questões anatômicas, me prendia. Expliquei, didaticamente, o que estava acontecendo. Não sem antes procurar mil textos na internet sobre o assunto, para saber se estava ou não sozinha nessa situação. Foi uma das experiências mais duras da minha vida.

Comecei contando sobre Caio, sobre a angústia do segundo lugar. Caio disse também que eu jamais seria “suficiente”. Até o sexo, meu relacionamento ia bem. Eu parecia ser suficiente. A partir das primeiras frustrações, deixei de ser. Caio, dos 13 anos, me assombrava. O que eu esperava em troca era um abraço apertado e um “vamos dar um jeito nisso juntos”. Recebi uma resposta atravessada, de que ele não tinha culpa das merdas que Caio fez. E, a pior parte: “você precisa ir ao médico, deve ter alguma coisa errada com você”.

Numa semana cinza dentro de mim, fui à médica. Que me disse o que eu e todas as mulheres já sabemos: não tem nada errado. Olhando pra trás, não sei como me expus a essa situação. Mas voltei da médica, disse que não havia nada errado comigo. O sexo continuou, a dor física passou, mas não existia ali muito de mim. Minha solidão da espera no consultório da ginecologia não passava. Terminei esse relacionamento e dei uma nova companhia ao fantasma de Caio. Mais um trauma pra lidar.

Comecei um novo relacionamento, no qual encontrei a paz do “pode ser”, do “sim”. O “não” veio, algumas vezes, com explicações seguidas de um olhar de compreensão. Entendi que o problema não estava em mim e que a maneira certa de lidar com o sexo se dá na primeira pessoa do plural. “Nós” podemos resolver isso juntos. Mas antes, tive que lidar com muita coisa na primeira pessoa do singular. Tive momentos de solidão necessária, momentos de solidão doídos.

Como grande parte das mulheres desse mundo, fui mal tratada. Isso dói e fica em nós por muito tempo. O próximo que passar pela nossa vida vai ter que aprender a lidar com as merdas feitas pelos anteriores, fatalmente. E não romantizem essa situação, homens. Vocês nunca vão entender a dor solitária que nos afligiu enquanto vocês estavam por aí, transando com outras, ouvindo histórias de feitos sexuais de outros. É um processo nosso e, caso a gente divida isso com vocês um dia, tratem com muito carinho e da maneira que nós tratamos na maioria das vezes: em silêncio. O amor, no final do dia, dorme em silêncio.




Estudante de jornalismo, atualmente mora em Amsterdã. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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