Aproveitei o mês de maio e o embalo do seu segundo domingo pra refletir um pouco sobre essa coisa grandiosa que é ser mãe. E que é não ser mãe.

Sempre admirei imensamente essas mulheres corajosas e incríveis que colocam um filho no mundo. Essas mulheres que se dispõem a externalizar seus próprios corações, a se meter nessa coisa (imagino) maluca e insana de amor sem fim, de entrega sem fim, de preocupação sem fim, de uma vida que já não é mais a mesma – e que nunca mais será.

Vejo “minhas mulheres” (as que de fato são parte de mim – família e amigas) com seus filhotes, olho para aquelas cenas de puro encantamento e penso: “UAU, foram elas – as minhas mulheres – que colocaram esses pequenos milagres no mundo! Que ato mais surreal!” E de alguma forma isso ENTRA em mim, me ensina por osmose; é como se uma parte do verbo MATERNAR se acomodasse no meu interior através do MATERNAR delas. Vai ver é porque amor de mãe é isso: ele não cabe em si mesmo e precisa se expandir pra não implodir. Então ele se joga até pra cima de quem está ali de bobeira, só observando…

– Ei, e você? Não pensa em usar esse encantamento como combustível pra gerar o seu próprio filho?

Não, não penso.
Eu, pra ser franca, nunca gostei nem de brincar de boneca ou de casinha quando era criança. Meu negócio eram os lápis de cor, os cadernos, os carrinhos de rolimã, o correr pela rua, a bicicleta, a bola – normalmente eu era a dona da bola, o que obrigava os meninos a me incluir no futebol em frente ao portão da dona Carmen. E eu estava isenta de ser goleira. Afinal, eu era (sou) menininha. ❤️

Assim como muitas mulheres que conheço, eu não tenho vontade de ser mãe. Pode ser que um dia eu me veja numa situação X que me faça rever essa decisão (se tem uma coisa que me fica cada vez mais evidente é que a tônica da vida é a impermanência). Mas hoje digo com tranquilidade que NÃO. Não me vejo mais feliz do que já sou com um bebê nos braços – ao contrário, me vejo desesperada. ?

Acho que o “pra sempre” que vem junto com a maternidade não se encaixa muito na minha percepção de impermanência. E no jeito que eu gosto de viver a vida. Muita gente chama de egoísmo. Eu chamo de autenticidade – essa coisa rara e difícil, ainda mais no meio dos tantos “TER QUE” a que estamos submetidas.

A partir do momento em que uma mulher se posiciona assim com relação à maternidade, o retorno imediato vem em forma de críticas, sarcasmo, dedos apontados. Como se uma mulher tivesse nascido, prioritariamente, para procriar.

A decisão de não ter filhos é tão séria e responsável quanto a decisão de ter filhos. Quem não tem filhos se torna mãe de si mesma. E ser mãe – vocês sabem – é “padecer no paraíso”.

Ser mãe de si mesma exige muito peito – que não é usado pra amamentar, mas pra segurar a bronca de ser julgada por sua escolha, de ser taxada de egoísta, complicada, “homossexual enrustida”, mal amada, incompetente, problemática, e por aí vamos. A lista é imensa.

Ser mãe de si mesma exige vigília constante – não pra cuidar de um bebê no meio da noite, mas pra brigar pela legitimação de suas vontades, de seus caminhos, de seus sentimentos. É ter que reforçar o tempo todo que uma mulher é uma MULHER, independente de ser mãe, de ser avó, de ser empresária de sucesso, de ser prostituta, de ser qualquer coisa, de ter qualquer rótulo. E uma mulher tem que ter sua essência respeitada em todos os lugares – não importando os papéis que assume (e que via de regra são muitos).

Ser mãe de si mesma é difícil porque a gestação dura bem mais que 9 meses. E o parto, o “colocar-se para fora e ser acolhida com amor e respeito” não depende de 10cm de dilatação do nosso útero, mas da dilatação da mente de uma sociedade inteira que nos julga.

Cabe lembrar que o tal julgamento também recai sobre as mães que são mães de si mesmas E mães dos seus filhos. São dedos apontados e mil “falhas” verbalizadas por gente que não está ali, na carne delas, lidando com a avalanche de tudo o que vem junto com uma barriga crescendo e uma pessoinha a mais existindo no mundo, sob a exclusiva responsabilidade delas. Como se não bastasse a autocobrança tão dura e injusta que já acomete essas mulheres.

Então, nesse segundo domingo do mês de maio, queria abraçar todas as mulheres. As que SÃO mães, pelo desafio imenso que carregam e pela linda coragem em assumi-lo. As que NÃO SÃO mães, pelo desafio imenso que carregam e pela linda coragem em assumi-lo.

Estamos todas no mesmo barco. Nossas escolhas são igualmente legítimas. Que possamos nos respeitar e nos apoiar, porque de uma forma ou de outra ambos os caminhos têm o enorme peso do “PRA SEMPRE”.

RESPEITA AS MINA! ❤️??




Graduada em Letras, com MBA na área de Engenharia da Qualidade, não trabalha nem numa área, nem na outra - o que mostra que nem tudo é linear nessa vida. Não é terapeuta, nem psicóloga; está começando a tatear seus caminhos profissionais na astrologia (porque é por ali, no meio das estrelas, que o coração dela estacionou há tempos...). Tirando a parte dos rótulos, ela é apenas uma dessas pessoas que tentam viver com ética, bom humor, leveza e autenticidade - e que nem sempre conseguem, mas continuam tentando. Escrever foi a forma que ela encontrou, desde muito criança, para organizar a bagunça da mente e do coração. Por sorte, tem funcionado desde então. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

3 COMENTÁRIOS

  1. Gi, sou eu a Rô de Gramado, super amei seu texto e viu hoje eu sou mãe e nem por isso deixaram de me julgar, de apontar, de criticar. Surgem novos julgamentos, novas criticas e assim vai.
    Super beijo.

  2. Seu artigo é simplesmente maravilhoso!
    me identifiquei de forma muito profunda contigo, na parte em que diz que o “pra sempre da maternidade”, não se encaixa na sua forma impermanente de ser. Eu também sou amante da liberdade, apesar de muitas vezes ela parecer uma “utopia”, mas o fato de ser uma escolha permanente e irreversível é o que mais causa pavor. E se eu não gostar da experiência de ser mãe? Devolvo o filho pra quem?
    Abraço,
    Psicóloga Patrícia.

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