Pela milésima vez me sentei na cama com as pernas cruzadas e uma bacia de pipoca para assistir “simplesmente acontece”. Estava chovendo na janela do meu quarto, e eu havia acabado de passar um café, então, o clima como um todo colaborou para que todo o excesso sentimental do filme se transformasse em uma infinidade de pensamentos sobre o que levamos com a gente, e mais ainda sobre o que deixamos para trás.

Dentre todas as cenas bem elaboradas e filmadas do romance, há uma – quase muda – que sempre me puxa pelos cabelos e dá uma espécie de estalo na mente.

Dura uma fração de segundo o olhar de Rosie, mas seu susto ao ligar o notebook e encontrar Bethany online na conta de Alex, e de repente saber que eles estão juntos e pretendem se casar, é quase uma atrocidade. Apesar de estar do outro lado da tela, e saber que tudo aquilo é apenas uma ficção, partilho da intensidade do momento encenado.

Porque nós somos assim? Porque precisamos ser tomados por uma corrente de desespero para então dizer a nós mesmos o quanto aquela pessoa significa em nossos dias? O olhar de Rosie pode ser compreendido, mesmo sem ela soltar qualquer som, pois nós conhecemos esse sentimento, nós sabemos exatamente o peso do susto de encontrar “aquela pessoa” segurando uma outra mão.

E quando isso acontece – Meu Deus! – como ficamos angustiados. É incrível nossa capacidade de nos desdobrar por alguém quando percebemos que esta pessoa foi capaz de seguir seu caminho sem nossa interferência, sem nossos beijos, sem nada que nos lembre a ela. É como se este afastamento fosse capaz de ligar em nós um sistema antes desligado, e talvez até mesmo inexistente, no qual, pela primeira vez nos deparamos com uma realidade que há séculos batia à porta: o seu coração deseja essa pessoa, e sua mente não é capaz de passar um único dia sem pensar nela.

Mas até este dado momento, isso era apenas detalhe, afinal, sempre confiamos no nosso taco, não é mesmo? Principalmente quando sabemos que a outra pessoa mantem sentimentos sobre nós.

Podemos nos lançar em uma louca paixão, mas é melhor continuar na solteirice. Pra quê beijar uma boca só se você pode beijar todas? Há a opção de dividir uma vida com alguém que se dispõe a compreender seus medos e defeitos e apreciar suas qualidades, mas porque andar de mãos dadas com uma só pessoa, quando se pode acordar segurando uma nova mão a cada dia? E ainda há o risco de conhecer alguém melhor. Pode ser que enquanto você prioriza um contatinho, outro mais inteligente e harmonioso aos seus olhos, surja. E aí, como fica?

E nessa história de não querer ninguém, a gente perde o outro todo dia, e não se dá conta disso. A gente inventa desculpas pra não sair, e diz que não quer namorar. Desliga o celular pra poder “dar um perdido”, e some das redes sociais, pra o outro nem desconfiar. O problema dessa vida é que enquanto a gente pensa que está enganando o outro, não consegue se dar conta de que o único engano é com si próprio.

É simples: a ilusão acontece sem que você perceba. Primeiro você se convence de que está muito bem, e que prefere essa vidinha de balada, porque namorar dá muito trabalho. Depois, adiciona um discursinho barato, desses que diz que é mais fácil ficar sozinho por conta de estudos e afins.

Passam-se os dias e você se aconselha de que não é bom pôr em risco a amizade; vai que não dá certo, né? E finaliza criando uma lei se silêncio, onde nenhuma pergunta, mensagem ou sinal dado pela pessoa em questão deve ser respondido, a fim de não alimentar expectativas. Pronto, está feito o bolo de indiferença sobre seus reais sentimentos. Agora é só enfiar goela a baixo.

Viu como é fácil? Mas o problema de toda comida não é o mastigar, e sim a digestão, e eu posso lhe garantir que esse bolo de sentimentos mal resolvidos vai lhe causar queimação por excesso de café e/ou álcool, dor de cabeça por conta da insônia e taquicardia, assim que você perceber que deu conta de perder uma pessoa que te amou de maneira profunda e sincera.

Eu sei, é difícil assumir para si próprio que mais uma vez o coração abriu a porta e deu passagem para alguém, e que isto pode lhe custar mais algumas feridas, mas sem sombra de dúvida não há dor maior que a de acordar todos os dias e saber que nunca deu certo porque você não se dispôs nem mesmo a tentar.

Em “simplesmente acontece” há dois protagonistas; a Rosie, e o Alex. Na minha e na sua vida há apenas um: o eu mesmo. Se for se inspirar para o próximo capítulo da sua história, escolha ser o Alex, que mesmo correndo riscos, se machucando e talvez pensando que o final feliz seria quase impossível, não deixou de tentar. Ele viveu suas outras histórias, e sim, ele pensou na Rosie, mas sabia que se não aconteceu, foi porque ela não quis, e não porque ele deixou de dar algum passo.

Preste atenção nos seus dias e no que tem verdadeiramente ocupado seus pensamentos quando a playlist pula para uma música que fale sobre olhos, boca, abraço, beijo, amor…

Se o amor da sua vida está a poucos passos, diminua essa distância; dê um passo à frente e veja as coisas acontecerem, antes que tudo se transforme em um enorme abismo de saudade e desejo por um tempo que nunca mais vai voltar a você. Lembre-se: duas pessoas só conseguem ficar juntas quando ambas fazem o possível para que isso aconteça, então, se conseguir, faça hoje mesmo a sua parte.




Há quem diga que os olhos são a janela da alma, então, no meu caso, eles são uma janela bem grande e aberta. Amante das artes, do universo e das palavras, necessito de música para viver, dos astros e estrelas para pulsar e dos versos para existir. A publicidade me escolheu; por isso anuncio paz, promovo sorrisos e transmito intensidade. Sou colunista do Fãs da Psicanálise.

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