Então a porta se fecha e ele se vai. Tão rápido como chegou. Resta uma lágrima, a cair pelo amor do momento, pelo prazer compartilhado, pela saudade que virá. Esta lágrima escondida a mostrar a dor de vê-lo partir sem saber o que levou. Apenas uma lágrima.

O silêncio e a escuridão a confundem. Não há provas de que ele esteve ali. Há apenas o lençol amarrotado, a toalha molhada, mas ela se desespera, pode ser de qualquer um. Então fecha os olhos e sente. O que a tanto faz sonhar, o que a tanto faz lembrar… seu cheiro. O cheiro que ela reverencia, o cheiro de que tanto necessita, seu cheiro está em todo lugar, na cama, no ar, nas paredes, em seu corpo, em sua alma. Cheiro esse que a faz cambalear toda vez que inala, que faz o seu íntimo ferver, seu coração bater. O cheiro que a faz ter certeza do que não tem e do que nunca terá, que abrange o medo do que o futuro dirá.

Ah, ele esteve ali, não há dúvidas. Ela se acalma, mas ainda há o que temer. Quanto valem esses momentos? Que tão rápido passam restando o erro, o lamento? Valem a dor da despedida? O vazio do depois? A loucura da inconsistência? Ela se pergunta e vai além.

Ele não a pertence, mas naquele instante, como é bom acreditar. “Eu sou seu”, ele diz. As verdades se confundem, e ela realmente esquece que ele mente. “Todo meu!” Ela repete. “Como é bom te ter pra mim.” Os olhos se encontram cúmplices. Não é verdade, mas não é preciso revelar. Outra lágrima escorre de seus olhos ao lembrar. “Eu sou sua.” Ela diz. Ele sorri. Será que ele sabe?

Em cada investida ele mostra sua intenção, de fazê-la escrava, de fazê-la sua. Em cada olhar ele a intima: você é minha. Em cada beijo ele a domina. Em cada gesto ele comprova já saber a verdade. Mas ela recua. Toda vez que seus olhos a denunciam, ela lança palavras a desconcerta-lo. A confiança é quebrada, ele desvia o olhar. Ela o desafia, uma pitada de dúvida surge no ar. “Consegui”. Ela vibra. Ele nunca saberá. Mas a cada novo passo de seu amante, a cada novo gesto de amor falso ela novamente se entrega.

Como não saber? Seu nome está marcado em cada parte do seu corpo e tatuado em seu coração. “Eu sou dele e que assim seja.” Ela suspira e novamente fecha os olhos. Amantes, apenas amantes não exclusivos. Ela se conforma, sente seu cheiro uma última vez antes de adormecer. Em sonhos, deseja somente que o próximo encontro chegue antes da última lágrima.




Publicitária por formação, aeromoça por opção e escritora por paixão. Virginiana, perfeccionista, mãe do Henri. Entre fraldas e mamadeiras, entre pousos e decolagens, entre artes e artimanhas, ela escreve. Escreve porque para ela, escrever é como respirar: indispensável à vida! É colunista do site Fãs da Psicanálise.

1 COMENTÁRIO

  1. Me fez lembrar uma poesia que escrevi há muitos anos: “A última lágrima”…
    Seu texto é intenso, revelador da dualidade que às vezes expressa nosso ser, inclusive quanto a sentimentos….

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