“Os namoros de hoje em dia não são mais como os de antigamente”, dizia minha avó.

Ela gostava de repetir essa frase sempre que a gente comentava sobre algum relacionamento que não deu certo ou sobre algum casal de mídia. Enchia a boca para falar. Era engraçado.

Eu sempre pensava que ela estava se referindo aos costumes, uma vez que, se compararmos, os namoros de quatro/cinco décadas atrás eram repletos de restrições. Que nada!

Uma vez, assistindo novela – que ela não assistia porque dormia, mas era só relar no controle para mudar de canal que ela acordava brava, alegando que estava ouvindo a TV, e misteriosamente, ela sabia tudo o que tinha acontecido naquele capítulo, mas eu juro que ouvia ela roncar -, minha avó repetiu seu bordão novamente e, aproveitando a situação, não me importei de interromper seu amado programinha para lhe questionar sobre:

– Por que a senhora sempre fala isso, vó?

– Porque é a verdade, oras! – Não foi bem a resposta que eu esperava, então lhe fiz outra pergunta, mais direta.

– Como eram os namoros antigamente?

– Bem melhores que os de hoje! – Exclamou, jogando a cabeça para trás e olhando para o teto, deduzi que estava se lembrando de momentos vividos e acho que acertei. – No meu tempo a gente sentava no sofá junto de papai e mamãe e namorava ali, na frente deles. Não tinha muito toque, a gente podia pegar na mão, mas ainda assim papai fazia umas caras feias.

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– Nossa, vó! E isso era melhor que os de hoje?

– Lógico, menina! – Ela me olhou brava, saindo de suas lembranças, mas durou pouco tempo. Logo ela voltou para o passado, narrando as memórias que ela guardava com muita saudade.

– A gente não precisava ficar com esse fogo que vocês ficam, não. Aliás, fogo de palha, né? Ave Maria! Pra gente o importante era estar perto. A gente valorizava os momentos. Era gostoso chegar o sábado pra gente poder tomar um cafezinho junto. Era tão bom! Mamãe enchia a casa com aquele cheirinho de café fresco e pão assando no forno… A manteiga até derretia. A parte ruim era que sobrava pra mim a louça, né? Mas valia a pena.

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Eram tardes gostosas, cheias de risadas. Hoje vocês ficam nesse negócio aí, ó – disse apontando para meu celular – e se esquecem das pessoas.

Não dá pra sentir cheiro, pra dar abraço, nem beijo, mas vocês preferem isso. Nunca vi coisa mais estranha! Se ficam juntos um minuto, tem que tirar foto pra colocar na internet e perder tempo vendo quem curte e essas coisas “sostificadas” da internet que eu desconheço.

“Se ama, coloca na internet. Se odeia, coloca na internet. Se tá junto, coloca na internet. Se tá separado, coloca na internet. Se tá feliz, coloca na internet. Se tá triste, coloca na internet. Tem que colocar tudo na internet. Ninguém quer saber, não. O povo quer é bisbilhotar pra rir por trás, filha. ”

– Ah…, mas não mudou muita coisa, vó. Só que hoje tem mais tecnologia e a gente adapta aos relacionamentos. – Eu sabia que tinha mudado, mas queria ouvir ela falar.

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– Ah! Que não mudou o que! Mudou sim! Hoje vocês nem sabem o que é amar. Vocês amam tudo, menos as pessoas. Tá difícil ver gente que ama, mas que ama mesmo… não gente que fica com fogo no rabo por aí. Estou falando de gente que manda carta, que dá flores, que sai debaixo de chuva pra matar a saudade, que atravessa a cidade pra dar um abraço. Gente que faz sacríficos. Isso é amor. Tecnologia é desculpa pra preencher vazio. Vocês gostam é de status.

– Eu não! – Me defendi.

– Você sim, porque se você não gostasse, não ficava o dia inteiro com a cara grudada nesse celular. Tem tanta coisa assim pra ver? Eu duvido que tenha.

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Ela encostou a cabeça na cabeceira da cama e olhou novamente para o teto, pensativa. Ficamos em silêncio, enquanto eu digeria as coisas que ela tinha me falado.

Por mais que eu negasse, minha avó tinha razão. Claro que não se encaixam em todos os relacionamentos, porque eu realmente acredito em alguns casais, mas se eu for parar para contar, não somam nem cinco – e olha que eu conheço mais de dez.

Eu sei que as coisas mudaram muito, mas as pessoas ainda são pessoas, e o amor deveria permanecer em nós. Acho que às vezes a gente tem medo demais, e talvez o medo seja o sentimento que consome nossa geração.

– Sabe… – Ela começou quase sussurrando – antigamente era amor, hoje é paixão. Eu sei que nenhum dos dois dura pra sempre, mas um a gente sabe que é verdadeiro.

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– E qual dos dois é verdadeiro, vó? – Mesmo sabendo a resposta, perguntei.

Ela me olhou, depois olhou para a televisão, em seguida para o relógio digital que ela tinha o maior luxo e então arregalou os olhos e exclamou com um misto de susto e indignação:

– Menina, já são onze horas e a gente aqui, perdendo o Ratinho!




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