Há bastante tempo tenho visto manifestações em textos e mensagens sobre se colocar no papel de outra pessoa para entendê-la e também para evitar julgá-la. A fórmula simples da chamada empatia parece estar cada vez mais difícil para nos humanos. Estamos tendo dificuldade em olhar para o outro, que dirá para se colocar no lugar dele, compadecer-se de sua dor, entender seus erros e a forma como se comporta.

De dentro e de fora dos nossos consultórios, assistimos a uma sociedade pedindo socorro enquanto caminha solitária pela vida apressada. Estamos nos tornando incapazes de olhar um para o outro.

Você já se perguntou qual foi a última vez que conversou com alguém disposto apenas a ouvir? Já se perguntou quando foi que olhou dentro dos olhos de uma pessoa enquanto ela fala? Lendo um texto essa semana sobre um homem que cometeu um massacre em 2011, o autor fala do quanto pode ser nocivo passarmos pela vida sem sermos vistos, e eu acho que pode ser muito pior quando não somos ouvidos.

É muito comum ver pessoas que sem perceber começam a ouvir o outro e terminam falando de si mesmas. Já viram aqueles casos onde um começa a contar sobre o TRABALHO e o outro logo interrompe e começa a falar do seu? Existem duas questões complicadas nesse diálogo: a primeira é a constatação da necessidade que todos nós temos de falar e a segunda é a de que somos pouco dispostos a ouvir.
Precisamos dessa troca, do falar e do ouvir, do ver e do ser visto, e isso precisa acontecer no mundo real.

O mundo virtual tem dado a todos nós a falsa impressão de que estamos sendo vistos e que estamos sendo lidos, mas a troca que se dá nessa circunstância é muito parcial e de fato, está gerando muita solidão e muita depressão em uma espécie que precisa de socialização, de convívio. Não nascemos para a solidão e ela pode nos adoecer. Estar sozinho pode ser prazeroso por um tempo, mas ser sozinho é uma péssima opção.

Sempre gostei muito de gente, e sempre tive o devaneio de andar nas ruas, em shoppings ou em qualquer transporte público e ficar observando pessoas e imaginando como é a vida de cada uma delas. Ás vezes, sentada em um bar ou restaurante, olho para alguém e imagino qual é a sua história, quais são as suas dores, seus amores, como foi o seu dia.

Saio completamente do meu mundo e entro naquele outro mundo, daquele outro que não sou eu – e isso faz com que eu seja menos egocêntrica. Em cada oportunidade de socialização que acontece em nosso dia existe a possibilidade de fazermos esse exercício. Imagine como é a vida do frentista que abastece seu carro pela manhã antes de você ir ao TRABALHO. Pense como foi a noite do gari que você vê varrendo a rua. Olhe para o atendente de caixa do mercado e imagine onde ele mora, com quem convive, quais problemas ele pode ter.

Sem o olhar e sem sair do seu mundo você não vai conseguir se colocar no lugar do outro e vai acabar vivendo sem que ninguém faça isso por você quando precisar. Enxergamos o mundo da posição na qual nos encontramos e, se não nos movimentarmos em outra direção, vamos morrer com essa visão egoísta e parcial. Imagine-se sentado em uma poltrona vislumbrando uma sala.

Você enxerga tudo o que está apenas no seu campo de visão, porém, ao se levantar e se sentar em outra poltrona na direção oposta, seus olhos vão conseguir enxergar o lado oposto da sala. Assim somos nós e o outro. Muitas vezes enxergamos os lados opostos e por isso fica difícil se entender. Para que haja entendimento é preciso que ambos estejam dispostos a mudar de posição e a ver o mundo de onde o outro enxerga.

Acomodados em nossas parciais certezas e nossas falsas razões, vamos abandonando a capacidade de observar e vamos nos distanciando de tudo que não seja nós mesmos. Sem empatia, sem nos colocarmos no lugar do outro, jamais vamos entender suas ações e seu discurso. As relações de amizade e de afeto se dão entre pessoas diferentes, não somos iguais em quase nada.

Estamos sentados em lados diferentes da grande sala, cada um enxergando um lado da vida e contando o que vê. É do entendimento dessa parcialidade de todas as verdades do mundo que conseguimos o que nos faz feliz: estamos juntos, vendo e sendo vistos um pelo outro.




Psicóloga, psicoterapeuta, especialista em comportamento humano. Escritora. Apaixonada por gente. Amante da música e da literatura. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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