A intuição é uma função psicológica, definida por Carl Gustav Jung em sua obra Tipos Psicológicos.

Resumidamente, as funções psicológicas, são: sensação, pensamento, sentimento e intuição. E elas são orientadoras da consciência em relação ao mundo, são formas de manifestação da energia psíquica. São como bússolas que nos norteiam em nossa caminhada.

A sensação nos diz que algo existe, o pensamento nos diz o que é esse algo, o sentimento dá valor e um propósito e a intuição nos mostra as possibilidades do que fazer com esse algo.

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Todos nós possuímos as quatro funções e elas são extremamente necessárias, sendo de absoluta importância o desenvolvimento por igual de cada uma delas para o nosso processo de individuação.

Entretanto temos uma que nos norteia de forma mais intensa, sendo a nossa função preferencial, se tornando mais diferenciada e desenvolvida que as outras. É nela que estão os nossos talentos, mas também a nossa zona de conforto.

Mas voltando à definição da função intuição.

Como dito anteriormente, a intuição nos dá possibilidades, ideias. Ela nos orienta para o futuro. Ela é o “faro”, o sexto sentido, a percepção extrassensorial, o palpite, o pressentimento. É uma função de percepção, portanto é irracional.

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Como sua percepção se baseia em processos inconscientes e subliminares se torna a função mais próxima dos arquétipos. Devido a esse fato, o intuitivo, principalmente o introvertido, pode prever novas possibilidades advindas do inconsciente coletivo, podendo prever até o que poderá vir acontecer.

Indo além dos fatos da realidade e enxergando as possibilidades das situações e coisas, a intuição se torna a grande “solucionadora” de problemas.

Em Tipos Psicológicos, Jung define intuição como:

“A intuição fornece, em primeiro lugar, apenas imagens e ou impressões de relações e condições que não podem ser conseguidas através de outras funções, ou só podem após muitos rodeios.

O tipo intuitivo age de forma generalista, ele não consegue enxergar os detalhes. Detalhes são uma especificidade da função oposta, a sensação. E é nessa generalização que ele encontra a criatividade, pois ele vê o todo.

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O intuitivo é um questionador, um incitador de revoluções, uma vez que nunca se encontra em situações aceitas por todos.

É um iniciador, um estimulador, pois está sempre em busca de coisas novas. Encontramos esse tipo nos grandes oradores, homens de negócio, empresários, políticos, vendedores e no pintor desconhecido que será reconhecido como gênio daqui a 30 anos. Portanto, no gênio incompreendido. São também os grandes místicos, profetas e os artistas.

Se ele se voltar para as pessoas será capaz de enxergar o potencial delas. Sendo aquele que é capaz de liderar, dar coragem e entusiasmo em prol de uma causa.

As perguntas típicas da função intuição: “O que poderia acontecer?” e “O que é possível?” Entretanto, nem tudo são flores para o tipo intuitivo.

Quanto mais unilateral for a atitude do intuitivo, mais ele detestará situações estáveis, vivendo em um escapismo da realidade constante onde o mundo concreto parece não existir.

Vive em um estado de constante pressa, pois a realidade (domínio da função sensação) é muito dura para ele. Negligenciando até as necessidades físicas mais básicas.

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O intuitivo vive de ideal em ideal. Quando ele se cansa de uma ideia ele vai perseguir sofregamente outra ideia, como se aquilo fosse a verdade única, sem antes aplicá-la na prática, ou testá-la na realidade. Quando todos aceitam a sua ideia, ou quando ela cai em uma rotina ele simplesmente a abandona, deixando quem o seguia na mão.

Sendo assim, nunca consegue terminar um projeto, (isso quando consegue implementar na realidade suas ideias!) indo sempre em busca de novas ideias tanto no mundo externo (extrovertido), quanto no mundo interno (introvertido).

Essa falta de persistência lhe custa caro, pois o outro sempre acaba colhendo os frutos de seu trabalho e fica com os louros da vitória.

Sobre essa problemática, Jung em Tipos Psicológicos, diz:

“Um fato só vale enquanto abrir novas possibilidades que o ultrapassam e dele libertam o indivíduo. Possibilidades emergentes são motivos cogentes dos quais a intuição não pode fugir e aos quais sacrifica todo o resto.”

Constantemente esquecem compromissos ou chegam atrasados.

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O extrovertido, por exemplo, tem pouca consideração pelo bem estar dos outros e não costuma respeitar os costumes. E o introvertido vive cada vez mais distante da realidade cotidiana. Além disso, ele não tem a menor consciência de sua existência corporal nem de sua influência sobre os outros, pois despreza o objeto.

Salientando novamente, todos nós possuímos as quatro funções, entretanto uma delas será mais desenvolvida e diferenciada em relação às outras três. Para que haja esse desenvolvimento da função principal as outras serão reprimidas, caindo sob o domínio do inconsciente.

Jung, em Tipos Psicológicos apresenta isso claramente:

“(…) das quatro funções básicas, apenas uma é totalmente consciente e diferenciada o suficiente para ser manipulada livremente e à vontade, enquanto as outras três são total ou parcialmente inconscientes.”

Mas uma delas será completamente reprimida, sendo justamente aquela que faz oposição a função principal. Pois a consciência a considera um estorvo. A essa função Jung denominou função inferior.

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A função inferior apresenta um caráter primitivo, não desenvolvido, que provoca desconforto na vida do indivíduo. É o calcanhar de Aquiles de cada um.

Ela, por ser inconsciente, se manifesta contra a vontade do ego, sendo espontânea, desajeitada, impulsiva, caprichosa, primitiva, arcaica e selvagem.

Além disso, ela tem como função complementar a atitude consciente do indivíduo. Um introvertido, portanto, terá um inconsciente extrovertido, e vice versa.

No caso do intuitivo, sua função inferior é a sensação. A função sensação é responsável pelos cinco sentidos e pela nossa noção de realidade, sendo a função que lida com os fatos concretos.

Não que o intuitivo não tenha noção da realidade, nem de suas sensações, mas ele prefere ignorá-las, negando-lhe a sua validade. Age assim como forma de mecanismo de defesa, pois, ela o incomoda e o estorva. Os estímulos dos sentidos o levam a olhar para as coisas físicas e ele quer justamente olhar além das coisas físicas.

Então, quando tomado pela função inferior, desenvolverá um deslumbramento com os sons, as cores, cheiros, esquecendo das possibilidades de cada coisa. E pior ainda, ele pensará que está analisando as possibilidades, pois uma característica da função inferior é se apresentar “disfarçada” pela função superior.

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Como o intuitivo vive com pressa – mesmo o intuitivo, que pode não demonstrar exteriormente, mas seu mundo interno borbulha de ideias – vivendo em um estado onde o presente é enervante ele irá sofrer as consequências de sua unilateralidade em seu próprio corpo. A doença vai obrigá-lo a “desacelerar” e a olhar para os sentidos, para o seu corpo e assim fazer com que ele tome conta de algo real.

No caso do introvertido, cuja sensação inferior é extrovertida, o objeto poderá provocar sonhos e fantasias fazendo com que ele se ligue impulsivamente com o objeto de forma obsessiva. Por vezes é tomado pela instintividade e falta de moderação, não percebendo sua dependência dos sentidos.

Já o extrovertido, com uma sensação inferior introvertida, pode desenvolver hipocondria, fobias e sensações corporais absurdas, além de uma preocupação excessiva com seu próprio físico.

Mas uma saída, proposta por Jung para que o intuitivo consiga sair de seu escapismo está no desenvolvimento das funções auxiliares.

Em Tipos Psicológicos, Jung diz:

“Mostra a experiência que a função secundária é sempre de natureza diversa, mas não oposta à função principal; assim, por exemplo, o pensamento, como função principal, pode facilmente unir-se à intuição como função secundária, bem como à sensação, mas nunca como ficou dito, ao sentimento.”

Desenvolver o julgamento o ajudará a pensar, avaliar, sentir, encontrando uma forma de refletir sobre seus atos, melhorando seus relacionamentos e tendo mais qualidade de vida. Assim, o caráter avaliativo das funções judicativas irão auxiliar em muito o irreflexão da intuição.

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Desenvolver a função sensação diretamente do inconsciente só vai causar dor e sofrimento para o indivíduo e não vai leva-lo a lugar algum. Por meio do desenvolvimento das funções auxiliares o ego pode ser fortalecido de forma a suportar o que vem de sua função inferior, lhe dando certa proteção.

Portanto, conhecer a problemática dos tipos não é simplesmente um capricho ou algo que sirva para satisfazer nossa curiosidade. A oposição entre consciente e inconsciente gera diversos conflitos internos e externos causando doenças psíquicas e muito sofrimento.

Esse conhecimento, então, auxilia o indivíduo a complementar a sua consciência e mudar a sua atitude aumentando seu conhecimento sobre si mesmo e ampliando a sua visão. No caso do intuitivo, suas ideias e possibilidades terão a chance de se tornarem reais sem a dor do fracasso.

Bibliografia
JUNG, C. G. Tipos Psicológicos. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 1991.
SILVEIRA, N. Jung: Vida e Obra. 20. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006




Hellen Reis Mourão é analista Junguiana e especialista em Mitologia e Contos de Fadas. Atua como psicoterapeuta, professora e palestrante de Psicologia Analítica em SP e RJ. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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